MANIFESTO
DE OUTUBRO
Breve Resumo Histórico
Sérgio de Vasconcellos
Em 24 de Fevereiro de 1932, no
Salão Nobre do Jornal “A Razão”, na Rua José Bonifácio, em São Paulo,
realiza-se uma reunião de intelectuais paulistas, convocada por Plínio Salgado,
com a finalidade de criar uma organização, que partindo do estudo da realidade
brasileira, estabelecesse uma orientação política segura, face ao caos que se
instalara no País, após a Revolução de 30. Compareceram: Ataliba Nogueira,
Cândido Motta Filho, Mário Graciotti, José de Almeida Camargo, Alpinolo Lopes
Casale, José Maria Machado, Francisco Stela, Gabriel Vendomi de Barros, João
Leães Sobrinho, Mário Zaroni, Fernando Callage, Iracy Igayara, Carvalho Pinto,
Sebastião Pagano, Arlindo Veiga dos Santos, João de Oliveira Filho, James
Alvim, Fausto Campos, Eduardo Rossi, Dutra da Silva e outros. Aprovada a
criação da entidade pelos presentes, Plínio Salgado marcou para 12 de Março, a
assembleia de fundação. Enquanto este pequeno
e seleto grupo
tomava uma decisão da qual brotaria o maior movimento
de massas do Brasil republicano, a Ação Integralista Brasileira, naquele mesmo
dia, um gigantesco comício, na Praça da Sé, com perto de 50 mil pessoas,
organizado pela Liga Pró-Constituinte, preludiava à Revolução
Constitucionalista.
No
dia 12 de Março de 1932, no Salão de Armas do Clube Português, de São Paulo,
obtido graças à intervenção de Eurico Guedes de Araújo, ocorre a Assembleia de
Fundação da Sociedade de Estudos Políticos – S.E.P. Mais de uma centena de
pessoas compareceram: Alfredo Buzaid, Antonio de Toledo Piza, Rui de Arruda,
Pimenta de Castro, Ângelo Simões de Arruda, Roland Corbisier Cavalcanti de
Albuquerque, Francisco de Almeida Prado, Ernâni da Silva Bruno, Lauro Escorel,
Almeida Salles, Rui Ferreira dos Santos, Waldir da Silva Prado, Luis Saia, os
irmãos Ignácio e Goffredo da Silva Telles, Azib Buzaide e muitos outros. Plínio
Salgado, Ex-deputado Estadual pelo Partido Republicano Paulista, jornalista
profissional e romancista consagrado, assume a Presidência e abre a sessão com
um discurso, do qual destaco a seguinte passagem:
“Senhores, por toda a parte ouço a palavra revolução; de todos os lados
nos chegam os écos de ingentes reclamos que, em meio à confusão dominante no
País desde Outubro de 1930, apelam para o ‘espírito revolucionário’. Na
verdade, tudo indica que o Brasil quer renovar-se, quer tomar posse de si
mesmo, quer marchar resolutamente na História. Clama-se por justiça social e
por uma mais humana distribuição dos bens; exige-se do Estado que intervenha,
com poderes mais amplos, tendentes a moderar os excessos do individualismo e a
atender aos interesses da coletividade. Neste momento, congrego-vos para
estudarmos os problemas nacionais e traçarmos em conseqüência destes estudos,
os rumos definitivos de uma política salvadora. No entanto, quero frisar, com a
maior veemência, que procede das profundas convicções espiritualistas
inspiradoras do meu pensamento e da minha ação, o seguinte: fala-se de
revolução, pedem-se revoluções; pois bem: façamos as que forem necessárias à
justiça humana e à saúde da Pátria, mas não nos esqueçamos um instante sequer
dos intangíveis direitos da pessoa humana. Peço-vos, senhores, que havendo de
reformar, de modificar, de revolucionar, tudo façais se assim vos ditar vossa
consciência; mas por favor, meus amigos, não toquemos no Homem. O Homem é
livre, Deus o fez livre e responsável, e o seu maior tesouro é a sua liberdade,
a intangível expressão da sua própria consciência, o caráter que imprime ao que
faz e ao que possui, o escudo com que se defende do arbítrio do Estado e da
Coletividade e é constituído pelo grupos naturais em que se integra. Assim,
repito-vos: não toquemos no Homem e na sua Liberdade”.
Em seguida, Plínio Salgado,
apresentou os nove princípios básicos que norteariam os estudos e ações da
S.E.P., que são:
“-
Somos pela unidade da Nação.
“-
Somos pela expressão de todas as suas forças produtoras no Estado.
“-
Somos pela implantação do princípio da autoridade, desde que ele traduza forças
reais e diretas dos agentes da produção material, intelectual e da expressão
moral do nosso povo.
“-
Somos pela consulta das tradições históricas e das circunstâncias geográficas,
climatéricas e econômicas que distinguem nosso país.
“-
Somos por um programa de coordenação de todas as classes produtoras.
“-
Somos por um ideal de justiça humana, que realize o máximo de aproveitamento
dos meios de produção, em benefício de todos, sem atentar contra o princípio da
propriedade, ferido tanto pelo socialismo, como pelo democratismo, nas
expressões que aquele dá à coletividade e este ao indivíduo.
“-
Somos contrários a toda tirania exercida pelo Estado contra o Indivíduo e as
suas projeções morais; somos contra a tirania dos Indivíduos contra a ação do
Estado e os superiores interesses da Nação.
“-
Somos contrários a todas as doutrinas
que pretendem criar privilégios de raças, de classes, de indivíduos, grupos
financeiros ou partidários, mantenedores de oligarquias econômicas ou
políticas.
“-
Somos pela afirmação do pensamento político brasileiro baseado nas realidades
da terra, nas circunstâncias do mundo contemporâneo, nas superiores finalidades
do Homem e no aproveitamento das conquistas científicas e técnicas do nosso
século.”
Tais Princípios Básicos foram aprovados pela unanimidade dos presentes.
A
S.E.P. passa a funcionar regularmente na mencionada Sala de Armas do Clube
Português de São Paulo (na Av. São João, esquina com Anhangabaú, hoje, Av.
Prestes Maia), que fora emprestada para tal fim, por intermediação de José
Maria Machado. Imediatamente, Plínio Salgado cria uma série de comissões e
subcomissões de estudos, indicando seus membros de acordo com as vocações
pessoais. As comissões reuniam-se diariamente e, duas ou três vezes por semana,
realizavam-se sessões plenárias.
Na
Assembleia de 06 de Maio de 1932, diante dos excelentes resultados das
comissões, Plínio Salgado propõe a criação de uma seção, que teria a finalidade
de difundir, em linguagem simples, as novas Ideias, buscando criar uma
consciência popular. Eis um trecho da Ata:
“Expondo em rápidas palavras a grave situação que o país atravessa, o
sr. presidente propôs que se organizasse, subordinada e paralela à S.E.P., uma
campanha de ação prática, no sentido de se infiltrar em todas as classes
sociais o programa político as S.E.P., decorrente de seus princípios
fundamentais. Essa campanha seria denominada ‘Ação Integralista Brasileira’. Essa
proposta foi unanimemente aprovada.”
Mas, Plínio Salgado vai
mais longe e propõe a elaboração de um Manifesto, o que também é aprovado,
nomeando-se uma comissão para a sua redação, assim constituída: Motta Filho,
Almeida Camargo, Ataliba Nogueira e Plínio Salgado, que foi designado Relator.
Enquanto a
S.E.P. prosseguia no seu trabalho eminentemente construtivo, paralelamente, a insatisfação dos
paulistas com o novo regime, aumentava dia
a dia. Tudo indicava
que Vargas pretendia manter
o chamado ‘Governo Discricionário’, indefinidamente...
Em 23 de
Maio de 1932,
à noite, o descontentamento popular
atingiu o auge,
uma multidão dirige-se à
sede do Jornal
“A Razão”, empastelando-o; então,
ainda não saciada
de destruição, a massa
dirige-se para a Legião Revolucionária de
São Paulo, tentando
invadir e incendiar sua
sede, começa uma batalha de rua, tornada
mais brutal com
a chegada da
força pública. Terminado,
na madrugada, o
conflito, o resultado fora,
centenas de feridos e quatro estudantes mortos: Mário Martins de Almeida, Euclydes Bueno Miragaia, Dráusio Marcondes de Sousa e Antonio
Américo de Camargo Andrade. Das iniciais dos nomes destes quatro jovens
sacrificados, formou-se aquela sigla simbólica célebre – MMDC -, que viria a
ser utilizada pelos revolucionários paulistas.
Do incêndio ateado no “A Razão” – que era dirigido
por Plínio Salgado -, escaparam, milagrosamente incólumes, uma mesa e uma
estante, justamente as que abrigavam os fichários e arquivos da S.E.P. e da
Ação Integralista Brasileira. Podendo, assim, Plínio Salgado continuar sua obra
de arregimentação das novas inteligências brasileiras.
Em Junho, a S.E.P. fez duas
reuniões. Na primeira, Plínio Salgado leu o anteprojeto do Manifesto, que
elaborara, em fins de Maio. Cópias datilografadas foram distribuídas a todos os
associados, para que lessem e trouxessem na próxima reunião, suas propostas de
melhoria do texto, acréscimos, emendas, etc. No segundo encontro daquele mês, o
Manifesto de Outubro foi aprovado, quase sem modificações. A intenção era
lançá-lo imediatamente, mas, Motta Filho e Almeida Camargo, insistiram que a
publicação fosse adiada, pois, o momento não era oportuno, a revolução era
iminente.
De fato, em 09 de Julho,
inicia-se a Revolução Constitucionalista. Todas as reuniões da S.E.P. foram
suspensas. Naquela ocasião, Plínio Salgado, reunido com um pequeno grupo,
declarou:
“Que cada um cumpra o seu dever
neste momento em que o Estado de São Paulo se encontra em armas: eu guardarei
este documento para, quando terminar este trágico episódio da nossa História,
vir com ele, porque talvez seja um
instrumento de salvação.”
Em 03 de Outubro de 1932,
terminava a Revolução Paulista. Um grupo – Eurico Guedes de Araújo, Iracy
Igayara, Alpinolo Lopes Casale, Antonio de Toledo Piza, Manoel Pinto da Silva,
Lauro Pedroso -, que naqueles conturbados dias, frequentava a casa de Plínio
Salgado, findo o conflito, concordara que era a hora de imprimir o Manifesto.
Lauro Pedroso encarregou-se de mandá-lo para a gráfica, mas, não tinha como
pagar a impressão... Então, Plínio Salgado. Iracy Igayara, Eurico Guedes da
Fontoura e Alpinolo Lopes Casale, quotizaram-se, levantando 200$, e propondo
pagar o restante a prestações, a tipografia aceitou e entregou os Manifestos na
tarde de 06 de Outubro.
No dia seguinte, 07 de Outubro de
1932, à tarde e a noite, às escondidas numa sala da Secretaria de Segurança
Pública, na mesa de trabalho de Eurico Guedes de Araújo, Plínio Salgado
endereçou pessoalmente centenas de envelopes, nos quais o Manifesto seria
remetido a todo o País, a distribuição na própria cidade de São Paulo foi feita
por membros da S.E.P. Eis a razão pela qual, o documento de fundação do
Integralismo, redigido em Maio, aprovado em Junho, veio a chamar-se “Manifesto
de Outubro”.